Confissão e "confissões" - debate2



Como era de prever, continuam a chegar partilhas sobre assunto tão delicado e que cala tão fundo no coração de todos nós, sobretudo os católicos.

Hoje, insiro a breve partilha de um padre passionista, creio que por volta dos 60-70  anos de idade. E diz ele:

Caro Pe. José Luzia.

Bom Dia.

Tenho acompanhado os acontecimentos de Moçambique através do generoso envio dos jornais que o senhor tem religiosamente enviado. Fico imensamente agradecido por isso. Desta forma me mantenho ligado à boa terra em que tive oportunidade de residir por catorze anos.


Quanto à sua reflexão sobre Confissão e confissões me fez rever e avaliar a minha atuação sobre este sacramento. Por isso agradeço imensamente. 

Grande Abraço. 

Pe. Fernando. 

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Mas uma mulher profundamente comprometida na pastoral em que toda a vida se envolveu, tanto em Moçambique e, agora, em Portugal, reagiu assim:

A propósito das Celebrações Penitenciais, a nossa paróquia tem todo um historial:

Enquanto estiveram os Padres Carlos e Tiago, 2 ou 3 vezes no ano, durante os tempos litúrgicos fortes, havia Celebrações Penitenciais muito inspiradoras nas quais participavam quase todos os paroquianos.

O Padre que se seguiu respeitou a tradição.

Depois veio um brasileiro que acabou com tudo dizendo que não era válido e as pessoas (a maioria) deixou de se confessar. Já lá vão 2 anos.

No Próximo domingo chegará um novo pároco. Estamos para ver como será nesta e noutras coisas. (Teresa)

Amanhã inserirei uma nova ajuda, enviada por um Chefe escuteiro.

Espero que diante destas partilhas também os não-padres se sintam obrigados a contribuir para uma séria renovação da celebração deste sacramento.

Confissão e "confissões" - debate1


Ao meu convite do post anterior sobre este assunto, reagiram, de imediato, 4 pessoas: 2 padres, e 2 não-padres (1 homem e 1 mulher).
Hoje deixo, para já, os dois primeiro: um padre de Cabo Verde e um homem de Portugal.

Diz o P. José Borja:

Salve, padre!

Obrigado pela sua partilha. Tem razão. As formas e a criatividade podem e devem mudar - de acordo com o texto, mas o essencial deveria ser manifestado por gestos e cânticos e outras manifestaçóes do rosto da misericordia de Deus. Este é afinal, o centro daquele encontro e não «o recitar» dos pecados.

O sacramento da confissão ou da reconciliação, de que as pessoas têm ainda «muito receio» ou a que infelizmente, não atribuem tanta relevância, porque mal conhecem, deveria ser um espaço de humanizaçáo e da experiència da misericórdia de Deus. Isto não acontece porque os ministros da confissão nao têm tempo, evocam ter muita gente para «atender» e acabam não atendendo de facto, porque a rotina não permite «encontrar-se» com a pessoa e o penitente,s e clhar, «não se encontra» com o Deus misericordioso que lhe deveria ser apresentado.

 Eu, por exemplo, prefiro «atender» a pessoa num espaço distinto da Igreja, para evitar a pressao das «filas» de quem mais espera a sua vez de confessar do que a beleza de encontrar-se com o Deus que a acolhe e perdoa e ajuda a caminhar.

Neste ano da misericórdia, o Papa tem dado dicas muito importantes de como transformar o sacramento em encontro e evitar a «pressão» de apenas contar os pecados.

Afinal, é tempo ainda de fazermos uma pastoral deste belo sacramento de modo a mostrar o que ele é:  um excelente lugar de revelação do rosto do Pai que acolhe o filho que volta arrependido. Mais isto do que o habitual tribunal onde cada um leva as suas «acusações» e mal se apercebe do perdão que se lhe dá (se calhar nem ouve nem entende as palavras da absolviçáo). Afinal, o filho «pródigo», não disse muita coisa e o Pai apressou-se a fazer uma festa de acolhimento que causou grande choque ao irmão mais velho.

Vamos a tempo. O Ano da misericórdia vai chegar ao fim, mas A MISERICÓRDIA de Deus há de sempre ser revelada ao mundo sedento de um Deus assim mesmo: pura misericórdia.

Para finalizar mesmo: se os cristãos descobrirem este rosto verdadeiro de Deus (e não a sua caricatura), não haverá muita falsa crise de fé. O que acha?

Padre Zé

Seminário S. José

Cabo Verde
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E diz o José E. Tendeiro:
Pela minha parte, aplauso, aplauso, aplauso.
Posso mandar isto ao teu quase conterrâneo P. Manuel Fernandes?
Pela tua clarividência um abraço amigo. (José Tendeiro)
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Amanhã ou daqui a dias inserirei as outras opiniões/partilhas sobre assunto tão delicado. Mas continuo à espera de mais. Quem preferir aparecer como anónimo pode optar por tal ou utilizar um pseudónimo que eu, obviamente, respeitarei. Mas personalizado é muito mais interessante....

Confissão e “confissões”




Nas minhas andanças por esse mundo além, aconteceu-me, como tantas vezes acontece a um padre, ser convidado a “ajudar” nas confissões.
Tratava-se de grupo específico, na rota da sua preparação para uma peregrinação à Terra Santa.

Aceitei com um misto de sentido de serviço mas também de curiosidade: provavelmente, iria ser parte de uma celebração penitencial criativa e sugestiva. Tinha ténues motivos para essa esperança.

Enganei-me. Depois de uma brevíssima introdução do pároco, presidente do acto a que não posso chamar “celebração penitencial” nem mesmo semelhante a muitas outras que já se praticam um pouco por todo o lado do mundo católico – apesar da recitação conjunta e breve do “confesso a Deus todo poderosos e a vós irmãos” -, os 6 padres presentes são distribuídos cada um por seu canto esperando os penitentes. Pura rotina!
Sem surpresas, chega-me uma primeira penitente em trajes tais que qualquer pessoa frequentadora destes espaços poderia ter sido tentada a aconselhá-la a ir vestir-se um pouco melhor. Mas, enquanto se aproxima, é para mim evidente a simplicidade da jovem.

 Senta-se e, de novo sem surpresas, vejo que nem sabe bem como começar a “sua confissão”. Para a ajudar a sair do embaraço pergunto “mas então o que veio fazer aqui?”. Resposta pronta: “Dizer os pecados”. Com um pouco de mais algumas palavras de ajuda lá chegou a formular “Pedir perdão a Deus”.

Então, antes de mais, faça isso, peça perdão a Deus, disse-lhe. E ajudei-a a formular uma petição bem pessoal que acabaria na fórmula mais que tradicional e bem acertada: "Pai, perdoai-me porque pequei".

Fórmula simples e orante que, com nova e subtil ajuda minha, repetiria 2 vezes, já com visível mudança do rosto, agora já orante e recolhido, escutando, também recolhidamente, e de olhos fechados, a minha oração de acolhimento, enquanto lhe pousava, levemente a minha mão sobre a sua cabeça:

"O Espírito de Deus desça ao teu coração para, com sinceridade, possas confessar, na sua presença, os teus pecados".


E abri caminho para aquilo que ela dizia que vinha fazer: dizer os pecados.
De novo, lá tive de a ajudar a fazer algum esforço de identificação de actos / coisas feitas, que ela considerava “pecado”. E, claro, ajudei-a a ir um pouco mais fundo, a dar conta, sobretudo, das “omissões” que bem descaracterizam a identidade de sermos discípulo de Jesus Cristo, embora muito religiosos, sobretudo a atenção aos outros, nas mais diversas circunstâncias. Estávamos, estamos ainda, no auge dos fogos e dos apelos de apoio da Cáritas! Mas disto, destes apelos, ainda não tinha dado conta!


Curiosamente, as outras 5 ou 6 pessoas que “confessei”, todas foram directas à “lista dos pecados”,  o trivial que todos já conhecemos e que, felizmente, nem tinham qualquer gravidade. Um jovem que, apesar da motivação imediata da confissão ser tão só a viagem peregrinante, foi de uma “perfeição” e densidade espiritual invulgar. Colocava, tão somente, o problema do seu crescimento interior! Mas foi um cometa na vulgaridade do que ali acontecia.

Mas volto ao ponto de partida:
1.      Como é ainda possível que persistam formas de celebração, tão rotineiras e, a meu ver, tão pouco pedagógicas, de um sacramento sempre dito tão relevante na vida cristã?
2.      Quando se conseguirá que os padres – principais agentes desta pastoral – passem a ser elementos transfigurantes desta celebração que incida mais na consciência da misericórdia e do perdão do que na acusação – às vezes inútil – dos pecados?
3.      Como foi ainda possível, numa celebração com um fim tão específico, prescindir pura e simplesmente do alimento da Palavra de Deus que, na evocação de figuras peregrinantes como Abraão, Moisés, Elias, Paulo, e tantas outras, teria uma riqueza inaudita?

E como eu ia disposto a partilhar mais uma celebração rica e de qualidade!
Ia com a secreta esperança de comparar com as riquíssimas celebrações que desde há 30 anos Deus me foi dando nas Pequenas Comunidades de Murrupula, Marrere e Malatane e que deixei indiciadas no caderno “Penitência e Confissão dos Pecados – Por que sim?”, e que já ensaiei também em Portugal com grupos de casais mais e menos jovens, sempre com grande satisfação.

 


A riqueza da criatividade litúrgica das jovens comunidades de Nampula deixo-a apenas indiciada nas imagens que ilustram este texto. 



 


Todas se reportam apenas ao momento da "Confissão dos pecados"
sempre vivida com íntima e profunda devoção, de quem acolhe o Espírito Purificador de Deus Pai e seu Filho Jesus, depois de uma cuidada partilha da Palavra proclamada!


Talvez, por contraste, possam ter alguma utilidade também fora dos espaços nampulenses.





  

Um velho e respeitado membro de uma comunidade, por sinal, quase cego, ecoando a Palavra escutada, confessa os pecados da
sociedade envolvente.

 






O significado purificador da Água batismal é, assim, intrinsecamente trazido para o imaginário de todos os participantes.

 Talvez tenha interesse receber opiniões sobre esta reflexão.
Aguardo-as no meu email: zeluzia@gmail.com


O Cego Leitor da Sé de Faro - Portugal

Tanta coisa já deixei de partilhar neste espaço porque o tempo não estica!... Mas hoje, nesta cidade de Faro, capital do Reino dos Algarves, fiquei encantado na celebração da Eucaristia da Sé. Aprestávamo-nos para escutar a Palavra de Deus deste domingo XIX do tempo Comum e eis que um cego, acompanhado por uma senhora que lhe servia de guia na aproximação e à vénia ao altar, avança para o ambão para proclamar a 1ª leitura, por sinal, do livro da Sabedoria.

E a leitura começa, com uma clareza de dicção, uma distinção e um ritmo encantadores! Como, infelizmente, inúmeros leitores e leitoras, com os seus dois olhos bem abertos, mesmo em liturgias de alguma solenidade, já tem acontecido não serem capazes de fazer!

Mas que encanto! Só tive pena de não ter tido uma máquina para registar a delicadeza daqueles dedos deslizando sobre o texto em braile!

Hoje, recuei quase 50 anos, aos tempos em que o Lúcio, de Pontével (Ribatejo-Portugal), e o Francisco Fernandes, organista e professor de música, ambos também cegos, me surpreendiam e me deixavam estupefacto pela sua teimosa energia de viver, nunca se resignando ao tratamento de "coitadinhos" que a sociedade, pela melhor das razões e sentimentos, bem o sabemos, continua a dispensar a pessoas desta condição.

Hoje, na celebração da Eucaristia da Sé de Faro, presidida por um excelente presbítero jovem, tive uma feliz vivência de graça!

No final, foi-me dada a possibilidade de falar da espantosa experiência eclesial que tivemos sob a  liderança pastoral de MANUEL VIEIRA PINTO, O VISIONÁRIO DE NAMPULA.